O fundamentalismo é uma tendência entre certos grupos e indivíduos que se caracteriza pela aplicação de uma interpretação literal estrita às escrituras, dogmas ou ideologias, juntamente com uma forte crença na importância de distinguir o grupo interno e o grupo externo1.
Geralmente, o fundamentalismo está associado a ideias sectárias, inflexíveis, sobre determinado tema, sobretudo com relação à religião2. No entanto, há outras variações do emprego da expressão “fundamentalismo” que podem ser observadas no debate público, como “fundamentalismo político”, “fundamentalismo econômico” etc2.
No âmbito religioso, a palavra “fundamentalismo” também se associa a atos violentos, como o terrorismo, e a regimes políticos teocráticos2. Em sentido mais amplo, o termo fundamentalismo pode significar qualquer posição de defesa de um conceito, ideologia ou doutrina, de ordem religiosa ou de outro tipo, de forma absolutamente radicalizada e fanatizada, sem qualquer análise isenta ou crítica3. (Wilkpedia e outras fontes)
Sou chamado de petista por haver votado no opositor do Bolsonaro nas últimas eleições (por acaso era o Lula, mas votaria em qualquer outro ser – vertebrado ou invertebrado – que pudesse evitar o segundo mandato daquela aberração).
Agora sou chamado de “defensor do Hamas” por expor críticas ao governo extremista de Israel, como se não fosse possível condenar as duas coisas: o terrorismo do Hamas e a reação abusiva de Israel, ambas criminosas.
A chaga de petista eu ainda tolero, pois apesar de todas as minhas restrições ao PT e à sua ala sectária, presa a dogmas e preceitos rígidos e ultrapassados, ainda enxergo alguma coisa positiva no petismo, em especial o seu compromisso histórico com a democracia e a preocupação com o bem-estar social.
Repito, não sou petista (já critiquei muito – e ainda critico – o PT e seus caciques), mas não recebo a pecha como insulto, ainda mais vindo de quem vem.
Agora o que ninguém nunca me viu ou verá fazendo é defender o uso da violência para a resolução de qualquer conflito, em qualquer esfera ou área de atuação humana.
É como no direito interno, o uso da violência é admitido em caráter excepcional, em circunstâncias extremas, como a legítima defesa e o estado de necessidade. Mesmo estas hipóteses excepcionais não acolhem o abuso e o excesso de violência, e esta é a questão que está neste momento sendo tratada, em relação a Israel, pela Corte de Haia.
Fique claro uma vez mais: o Hamas só tem um único objetivo em sua existência, a destruição do povo judeu e do Estado de Israel. Nada, ABSOLUTAMENTE NADA justifica uma entidade cuja existência se baseia no ódio e cujo método primordial é a violência e o assassinato.
Dito isto, o conflito envolvendo o Estado de Israel e o Hamas – e toda a violência praticada por ambos os lados – acaba ocultando e colocando em segundo plano o verdadeiro problema a ser resolvido, a situação deplorável do povo palestino e a necessidade da criação de dois estados na região, o que já foi preconizado pela ONU desde a criação do Estado de Israel em 1948.
Devo dizer que se perder na discussão a respeito de quem tem razão, Israel ou Hamas, é inútil e desnecessário; primeiro porque estamos a milhares de quilômetros de distância do conflito, e ninguém verdadeiramente sabe o que está acontecendo lá (temos informações de um lado e de outro, nem todas confiáveis); depois porque, no máximo, poderemos apontar o menos errado. Para o observador distante é mais fácil admitir que ambos estão errados pelo uso da violência, e pensar sobre o que fazer daqui por diante.
Quem pensa no ser humano, nas vítimas inocentes deste conflito, precisa questionar como evitar a escalada da violência, e partindo daí pensar em alternativas para a obtenção da paz; não para proteger o Hamas, como me acusam, mas para evitar mais mortes palestinas e de judeus.
Apesar de entender que o caminho da paz é o único possível, também compreendo que, por razões milenares, é um caminho difícil e espinhoso, daí porque não vou me estender sobre este tema. Solução existe, mas para tanto é necessário diálogo, o que os extremistas do momento não desejam.
E é isto o que mais preocupa, nossos tempos favorecem os conflitos e os entendimentos binários, do tipo certo ou errado, bem ou mal, bonito ou feio. A guerra Israel x Hamas não é fato isolado, num mundo cada vez mais propenso a conflitos e violência.
É um fenômeno atual, que se explica, entre outras razões, pela chaga do FUNDAMENTALISMO, alimentado pelos superficiais debates de redes sociais (o paraíso dos extremistas), que nos empurra ao abismo, e que explica como chegamos ao ponto em que, em tudo, somos obrigados a tomar partido: Lula x Bolsonaro, Hamas x Israel, Direita x Esquerda, Capitalismo x Comunismo, etc.
Tudo vira um jogo de loteria esportiva, onde você só pode assinalar coluna 1 ou 2, não existe o empate, como não existe ponderação e bom senso.
Fundamentalismo não é, por si, uma corrente de pensamento, nem sequer está associado a determinada corrente política, religiosa ou econômica. É apenas um modo de agir, um sistema de conduta onde pessoas que acreditam e defendem uma doutrina ou ideia – qualquer que seja –, o fazem de modo radical e fanático, sem admitir espaço para o diálogo ou a compreensão mútua.
O fundamentalismo está associado à inflexibilidade e rigidez, de tal modo que aqueles que assim se expressam (que nunca se admitem fundamentalistas) só reconhecem a sua própria verdade, que ganha verniz de algo absoluto, imutável. Todo pensamento divergente é inaceitável, e quem o expressa é visto como adversário ou inimigo a ser convencido da verdade ou, isto não sendo possível, derrotado.
Há um público cativo para ideias fundamentalistas – como bem percebeu Steve Bannon -, um público avesso à reflexão e ponderação, maioria nas redes sociais, e que adora soluções diretas e simples: certo ou errado, bom ou mau, bonito ou feio, céu ou inferno…
O fundamentalista – de qualquer orientação ou vertente – se expressa e se encontra na ideia de que “a verdade está do meu lado, não admite a mínima concessão”, o que, por sua vez, leva à conclusão de que “o outro lado (sempre precisa haver um) está absolutamente errado, e deve ser derrotado a qualquer custo”.
Está na raiz desta postura a capacidade de receber as notícias que confirmam o seu pensamento como verdades absolutas, que nem precisam ser checadas ou conferidas. É tudo que os radicais precisam para perpetuar a enganação.
É reconfortante ser fundamentalista, especialmente se em um grupo a maioria pensa ou expressa sua opinião de maneira monolítica, a favor de A ou de B.
Evidente que, com tais premissas, os fundamentalistas não convivem bem com a democracia, pois se o opositor é visto como inimigo a ser derrotado, alguém a serviço do “mal” (todos os fundamentalistas são senhores do “bem” e de sua própria verdade), a derrota nas urnas é inaceitável, será sempre fruto de fraude ou armação “inimiga”.
O oito de janeiro é reflexo desta ordem de coisas…
Não que o fundamentalismo político tenha dono, ou seja exclusividade da direita radical (a turma da Gleisi Hoffmann está aí e não me deixa mentir). Ao contrário, ele é abraçado por cristãos e muçulmanos, direita e esquerda, banqueiros e sindicalistas, a lista é enorme. Onde houver posições radicais, inflexibilidade e falta de disposição para o diálogo a semente estará plantada.
Este é o perigo das certezas absolutas, que não convivem bem com a ciência, muito menos com o diálogo.
É um fenômeno mundial, tendência que dificilmente será revertida em curto prazo, tantas são as fake news e versões da “verdade” propagadas por grupos extremistas.
O radicalismo extremo conduz inevitavelmente à violência, revoluções, guerras e mesmo ao terrorismo.
Infelizmente, este é o momento que o mundo testemunha hoje.